segunda-feira, 16 de abril de 2012

O único meio de enfrentar o tsunami monetário


A Presidenta Dilma Rousseff tem dado um show nas suas relações internacionais. E está dando um show ainda maior na relação com os banqueiros internos. Pela primeira vez na história, um presidente da República que entende do riscado, contornando as ambigüidades de seu próprio Ministro da Fazenda, decidiu enfrentar a máfia bancária tocando no ponto essencial dos spreads exorbitantes, sem paralelo no mundo. O artigo é de J. Carlos de Assis.

Quando a presidenta Dilma acusa os bancos centrais dos EUA e da Europa de provocarem um tsunami monetário que afoga em dinheiro barato os países emergentes, o que ela tem em vista, no fundo, é o efeito cambial que isso causa, levando à valorização de nossa moeda, ao aumento de importações e queda de exportações, tendo por conseqüência última a expansão do desemprego. Ela está cheia de razão, portanto. Contudo, é uma ilusão achar que a solução para isso está na mudança da política monetária de EUA e da Europa. Está no nosso próprio quintal.

Tanto o presidente Obama como os líderes da área do euro se impuseram fortes restrições em matéria de política fiscal: Obama, com menos gosto (condicionado pelo Partido Republicano), e a Europa, sob o tacão alemão, francês e inglês, de extremo conservadorismo e ortodoxia fiscal. Portanto, se é para usarem a política macroeconômica para estimular a economia, só têm como alternativa a política monetária, que por sinal não é de governo (é dos BCs) e nem está direcionada para a retomada do crescimento, mas para a salvação do sistema financeiro.

Na medida em que os países industrializados avançados insistem na política de arrocho fiscal, com a única expectativa de aumentar as exportações, a desvalorização do câmbio se manterá como arma voltada contra o resto do mundo num esquema de protecionismo disfarçado pelo câmbio. Não adianta a Presidenta protestar contra isso. Ela tem que tomar medidas concretas para barrar o tsunami na fronteira de nosso quintal. Basicamente, tem que adotar controles de movimentos de capitais mais fortes que os adotados até aqui com o modesto aumento do IOF.

Isso não depende de banco central estrangeiro nem de outros governos. Está na órbita de nossa soberania. Até mesmo o FMI passou a admitir controles de capitais em situações excepcionais, e esta, indubitavelmente, é uma situação excepcional. Não é que seja necessário bloquear todo o dinheiro que tenta entrar. Basta bloquear o dinheiro especulativo. Ou adotar uma espécie de filtro para deixar passar apenas os recursos externos destinados a investimentos produtivos, que certamente ajudam na geração de emprego e renda internos.

Claro que a Bolsa sentirá um baque pois o dinheiro especulativo alimenta a valorização de ações no mercado. Contudo, deveremos hipotecar a saúde da economia brasileira ao conforto de meia dúzia de especuladores no mercado acionário? Há quanto tempo não se ouve falar sobre colocação primaria de ações em nosso mercado, no único momento em que a Bolsa efetivamente contribui para o financiamento de atividade produtiva? Também o acesso de dinheiro externo a aplicações em títulos de liquidez diária, sobretudo públicos, deve ser totalmente eliminado. 

A Presidenta tem dado um show nas suas relações internacionais. E está dando um show ainda maior na relação com os banqueiros internos. Pela primeira vez na história, um presidente da República que entende do riscado, contornando as ambigüidades de seu próprio Ministro da Fazenda, decidiu enfrentar a máfia bancária tocando no ponto essencial dos spreads exorbitantes, sem paralelo no mundo. Isso nos anima a esperar medidas igualmente efetivas no campo das relações financeiras internacionais, no qual a questão do controle de capitais tornou-se simplesmente vital.

(*) Economista e professor, presidente do Intersul, autor, com o matemático Francisco Antonio Doria, do recém-lançado “O universo neoliberal em desencanto”, pela Civilização Brasileira. Esta coluna sai também no site Rumos do Brasil e, às terças, no jornal carioca Monitor Mercantil.

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